sábado, 12 de setembro de 2009

Relatório da FIA indica que alegações de Nelsinho são verdadeiras

Investigação conduzida pela FIA conclui que alegações de Nelsinho Piquet de armação no GP de Cingapura do ano passado são verdadeiras

Warm Up

A investigação que a FIA conduziu sobre o caso Cingapura concluiu, após a denúncia de Nelsinho Piquet, dados da telemetria e (a falta de) declarações de Pat Symonds que as acusações do brasileiro referente ao acidente deliberado são, "em larga parte, verdadeiras".O dossiê detalha datas e dados, legenda telemetria e indica esboços de respostas de Symonds que acabam representando uma confissão indireta do plano que armou uma batida de Nelsinho na volta 14 daquela corrida para beneficiar Fernando Alonso, que acabou como vencedor.Piquet foi convocado para ir à sede da FIA em Paris para prestar depoimento sobre o episódio cingapuriano quatro dias depois de seu pai, Nelsão, avisar Max Mosley do ocorrido. Nelsinho esclarece que participou de uma reunião com Flavio Briatore e Symonds em que ficou acordado o acidente proposital entre as voltas 13 e 14, fato que se daria depois da parada de Alonso nos pits para troca de pneus e reabastecimento.Além do já divulgado dias atrás, Nelsinho explicou que, para perder o controle de seu carro na saída da curva 17, tocou o acelerador antes do previsto. Quando estava rodando, instintivamente tirou o pé do pedal e depois voltou a pressioná-lo, "quase 100%", até haver o choque no muro de concreto. "Os dados de telemetria mostram claramente isso", afirmou Piquet.

A telemetria abaixo aponta que o traço da aceleração, vermelho, aponta o dito por Nelsinho, que deu 100% no pedal antes do normal para induzir a uma rodada, a tirada de pé (A) e a reaceleração total para chegar no momento da batida (B).

De posse da acusação de Piquet, investigadores da agência especializada Quest, os comissários do GP da Bélgica — Lars Osterlind e Vassilis Despotopoulos, ambos membros do Conselho Mundial da FIA, e Yves Bacquelaine —, Herbie Blash, observador da FIA, deram início às investigações, entrevistando membros da Renault e Alonso, e a posteriori chamaram Symonds.

Posto na parede em 27 de agosto em Spa-Francorchamps, o diretor da Renault foi questionado sobre a reunião e o que foi dito nela, a batida na volta 14 e o encontro com Piquet para definir o lugar específico do ato. Para nenhuma destas perguntas houve uma negativa, algo que seria comum se não houvesse participação no plano. Blash ainda comentou que a "falta de vontade" em colaborar poderia significar uma confissão, e Symonds rebateu que "esperava isso".

No dia seguinte, Pat foi novamente convocado, e pouco acrescentou — após ter conversado com Briatore, que havia chegado à pista belga.Eis o diálogo de Blash com Symonds:

Comissário da FIA: (Com relação à reunião de Cingapura envolvendo Flavio Briatore, Pat Symonds e Nelsinho Piquet) Em suas próprias palavras, Symonds, você se lembra do que foi dito a Nelsinho Piquet naquela reunião? Isto é, pouco antes da corrida.

Symonds: Eu realmente não me lembro.Comissário da FIA: Você não se lembra? Symonds: Não.

Comissário da FIA: Nelsinho Piquet afirmou que você pediu para que ele causasse uma falha deliberada. Isso é verdade?

Symonds: Nelson tinha falado comigo no dia anterior e sugeriu isso. É isso o que gostaria de dizer.

Comissário da FIA: Symonds, você estava ciente de que haveria um acidente na volta 14? Symonds: Eu não quero responder a essa pergunta.

Comissário da FIA: Há apenas uma coisa que eu quero perguntar e vou colocá-la de uma forma que você possa pensar a respeito, pelo menos. Piquet diz ter tido uma primeira reunião com você e Flavio Briatore. Depois, você encontrou com ele individualmente com o mapa do circuito. Você se lembra disso?

Symonds: Eu não vou responder. Prefiro não responder a isso. Não me lembro, mas parece que a conversa de Nelson foi sobre mais do que isso.

Comissário da FIA: Piquet também diz que, nessa reunião, você apontou um lugar específico do circuito onde ele deveria bater e disse que o local era o mais afastado de qualquer um dos equipamentos de segurança ou de elevação e onde existia a chance mais provável do carro de segurança ser acionado.

Symonds: Eu não... Não quero responder a essa pergunta.

Comissário da FIA: Porque, só para ficar bem claro aqui, que Nelson Piquet Jr. disse que, nessa reunião, foi você que pediu para que o acidente acontecesse de forma deliberada. Symonds: Eu não posso te responder.

Comissário da FIA: Se eu pudesse dizer que, Symonds, você foi colocado na posição de pedir que Piquet causasse o acidente, seria muito melhor. Seria muito melhor para você a longo prazo.

Symonds: Compreendo perfeitamente isso.

Comissário da FIA: Sim. Symonds: Eu não tenho intenção de mentir para você. Não menti para você, mas eu tenho de preservar, ao menos um pouco, a minha posição.

Comissário da FIA: E você está ciente de que os comissários podem tirar conclusões a partir de sua falta de disposição para auxiliá-los em relação ao que se passou nessa reunião?

Symonds: Eu gostaria de esperar. Gostaria de esperar, absolutamente.

Comissário da FIA: Eu acho que não tenho dúvidas. Symonds também foi questionado sobre a impressão do incidente, via telemetria, tanto do carro de Alonso quanto do de Piquet. As cópias foram mostradas a ele.

Comissário da FIA: Eu acho que você já sabe o que vou lhe perguntar aqui. Symonds: Eu acho que sim.

Comissário da FIA: Há um giro mais significante gravado aqui. Você vai ver que foi marcado pelo departamento técnico da FIA como um rápido aumento de aplicação do pedal do acelerador .

Symonds: Hum.Comissário da FIA: Não, está no acelerador. Há uma ligeira liberação do acelerador quando as rodas começam a girar, mas quando estão mais elevadas, parece haver uma reaplicação do acelerador em quase 100%.Symonds: Sim.

Comissário da FIA: Vou dizer para você, Symonds, que isso é uma parte muito incomum da telemetria e que sugere que este pode ter sido um acidente proposital.

Symonds: Concordo que é incomum.

Comissário da FIA: Você diria que foi uma batida deliberada?

Symonds: Não tenho certeza de que eu já vi uma colisão deliberada, por isso eu ... Os dados são muito incomuns.

Comissário da FIA: É contra-intuitivo para um piloto colocar o pé no acelerador por completo quando ele está rodando, não, Symonds?

Symonds: É. Sim, quando ele está rodando, é contra-intuitivo.Briatore, então, foi o alvo. Negou tudo. Disse que ficou sabendo por um membro de sua empresa de gerenciamento de pilotos sobre a acusação da armação e que foi, tal como já dito, vítima de extorsão da família Piquet e que levaria o caso à justiça se este viesse à tona.

Foi o que fez.Só depois das entrevistas feitas que a FIA e a Quest tiveram acesso aos dados da Renault, em disco, e à transmissão de rádio. As informações da equipe apontavam as estratégias de corrida, que davam a Alonso a chance de parar duas ou três vezes. Em ambas, o espanhol largaria com uma quantidade de gasolina parca, de 63 kg, que o faria ir aos pits na volta 14.

Para Nelsinho, a tática seria de duas paradas, com combustível considerado normal, nas voltas 28 e 44.Symonds acabou, então, mudando o estratagema de Alonso durante a corrida, fazendo-o parar duas voltas antes do previsto.As gravações de rádio mostram um Symonds nervoso por Alonso estar perdendo tempo sem conseguir superar um rival. "Enquanto estivermos atrás de (Kazuki) Nakajima, estamos fodidos", bravejou. Um engenheiro concordou, dizendo que "sim, vai foder nossa estratégia de três paradas completamente".Symonds surpreendeu o engenheiro — e daí imaginar que ninguém mais na Renault sabia da conspiração — com a informação de que não seriam mais três paradas. O funcionário lembrou que, pelo desenrolar da corrida de Alonso, a ida ao pit poderia acontecer na volta 15 ou 16. Respondeu

Symonds: "Não se preocupe com o combustível porque eu vou tirá-lo desse tráfego mais cedo."Enquanto Symonds "lamentava" Alonso não passar Nakajima, o dirigente reclamava um suposto problema nos computadores. O japonês da Williams, então, passou Jarno Trulli. No giro seguinte, o espanhol fez o mesmo, mas permitiu que Kazuki abrisse 4s de vantagem.Concomitante a isso, Piquet perguntava em que volta estava. Era a 8. A um engenheiro, que pensava que a dúvida de Nelsinho se dava por conta do consumo de gasolina, Symonds falou que "só fala para ele que está... está para completar... completar a volta 8". O brasileiro explicou que não conseguia ver a placa dos boxes.

Apesar de começar a andar quase 1s5 mais rápido que Nakajima, Alonso avisou que estava com problemas de aderência em seus pneus. Apareceu na história Briatore, que disse: "Não tem como passar Nakajima com esses pneus".Aí Symonds "mudou" a estratégia. Apontou que Alonso pararia na 12, "porque parece que vai dar certo". Um engenheiro perguntou a Pat "se não era um pouco cedo", e Symonds "teimou". Briatore concordou com um "não temos nada a perder". Alonso, então, fez sua parada."Certo, vamos nos concentrar em Nelson", comentou Symonds. Piquet estava atrás de Rubens Barrichello e, apesar da pressão, não o superava. "Fala para ele pisar fundo", pediu Briatore.

Symonds começou a observar o tempo de volta de Nelsinho. Trinta segundos depois, o brasileiro abria a 14.Symonds pediu ao engenheiro de Piquet que "você tem que forçá-lo muito agora. Se ele não conseguir passar Barrichello, ele... ele não vai a lugar nenhum. Ele tem que passar Barrichello nesta volta". Segundos depois, veio a batida.Briatore reagiu com uma série de palavrões, um "foda, ele não é piloto".

Mesmo assim, manteve seu "não-piloto" para a temporada 2009, com uma redução salarial, de US$ 1,5 milhão para US$ 1 milhão, e um contrato com base numa cláusula de performance.Depois de analisar a telemetria e os depoimentos, os comissários do GP da Bélgica decidiram enviar a questão ao Conselho Mundial. Eles não puderam questionar Piquet sobre as alegações de Symonds de que foi o piloto quem levantou a possibilidade de uma batida intencional, mas consideraram que a admissão de Symonds de que houve a discussão da possibilidade é um "suporte substancial" da alegação de Piquet de que a batida foi deliberada.Segundo os comissários, a soma de vários fatores levaram a "concluir que as alegações de Piquet são, em sua maior parte, verdadeiras." Estas questões foram a confissão de Symonds de que conversou com Piquet, sua recusa em responder nos dias 27 e 28 o que foi discutido quando ele, Piquet e Briatore se encontraram antes da corrida, e, por último, sua recusa em negar que indicou onde e em que volta Piquet deveria bater.

O relatório destaca que os comissários não consideraram somente a telemetria para ter uma evidência conclusiva de que Nelsinho se acidentou intencionalmente, mas usaram a confissão como base para saber como ele causou a batida.Pouco depois, o relatório reitera que foram as alegações de Piquet e as respostas e recusas de Symonds em responder o que conduziu os representantes da FIA àquela conclusão. "Parece indicar aos comissários que poder ter havido alguma conversa na presença de Briatore sobre a possibilidade de causar uma batida deliberada", diz o texto. Apesar disso, não se declararam prontos "para tirar qualquer conclusão definitiva em relação ao conhecimento ou envolvimento de Briatore".Ainda assim, o documento declara que "a reação de Briatore quando ouviu dos comissários que seu diretor de engenharia havia admitido que discutiu um acidente proposital com Piquet não pareceu ser de susto ou raiva" e que a carta de Flavio a Nelson Piquet é uma "estranha reação à tal séria alegação" de extorsão por parte do tricampeão para a manutenção do filho na equipe.O texto levanta suspeitas sobre a veracidade da acusação de Flavio.
"A resposta mais lógica vinda de uma posição de inocência poderia ter sido a abertura de uma investigação interna ou relatar as alegações à FIA, tomando todas as providências necessárias para confirmar que elas eram infundadas, acabando, deste modo, com a suposta ameaça de extorsão."O relatório da FIA é finalizado com a confirmação de que "existe uma evidência que, no geral, sugere que a batida de Piquet foi deliberada e fazia parte de um plano destinado a assegurar um benefício para a equipe, em que pelo menos um membro da cúpula da Renault foi cúmplice."

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